segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Biscoito da Sorte

máquina de textos desativada por alguns dias mas o biscoito da sorte "o fogo só queima onde ainda tem madeira"; pensem sobre

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

máquina de limpeza

eu tenho que limpar eu tenho que lavar e esfrega o chão e esfrega a parede e esfrega o banheiro e esfrega os pratos os copos os garfos as facas a geladeira os ímãs da geladeira as mesas os quadros a televisão as cadeiras o telefone o rádio o computador o ventilador a cama o guarda-roupa as portas os tapetes antes de entrar tire os sapatos não quero sujeira aqui ela já não sabia o que ela limpava o que ela esfregava talvez ela quisesse pegar a bucha e se esfregar até arrancar do seu corpo algum pensamento como se fosse poeira

terça-feira, 23 de outubro de 2007

máquina de limpeza

mas tinha as gaiolas dos passarinhos ainda ela tinha dois passarinhos era Garibaldi e Thierry o nome deles o que é que se faz de dois passarinhos empoeirados ela pensou o que é que se faz ela repetiu com cansaço quase sem fôlego eu lembro que ela quase chorava eu lembro que foi quando ela percebeu que por mais que ela limpasse a poeira não desistiria eu lembro que foi quando ela se sentiu impotente com seus panos suas buchas seus produtos de limpeza eu lembro que foi quando ela pegou as gaiolas dos passarinhos foi até o tanque encheu o tanque de água e mergulhou (com desespero) (com mágoa) as gaiolas dos passarinhos na água

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

máquina de limpeza

até as plantas estavam empoeiradas já não adiantava passar um pano úmido tinha que pegar uma bucha e esfregar tinha que pegar cada folha das plantas e esfregar esfregar esfregar com a bucha até que a poeira saísse ela não gostava de poeira ela não gostava da possibilidade de poeira mas as suas plantas ficavam empoeiradas ela esfregava suas folhas com força com raiva quase sem fôlego como se a poeira fosse um desaforo e se as plantas ficassem empoeiradas de novo ela esfregava mais uma vez quando terminava de limpar suas plantas ficava aliviada agora sim já conseguia respirar mais tranqüila agora sim mas tinha as gaiolas dos passarinhos ainda

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Seção Infantil

Carolina é muito atenta na escola, ela fas todas as lições de casa e da classe. Nunca ela levou um bilete para casa. Porque Carolina é boa menina. Ela estuda muito para a prova. Ao chegar em casa ajuda a sua mãe limpar a casa, depois ela toma banho almosa e vai descansar. De sabado e domingo Carolina vai passear ou para o boque ou para a cidade das crianças ou para o clube etc. Carolina da um passeio também com a professora, um passeio, dois passeio, três passeio, ou mais. Ela a professora e os alunos. E ela ajuda a professora a segurar os alunos, e comferir para ve se esta faltando se estive faltando ela fica cuidando dos aluno enquanto a professora vai atrás dos outro. E voltam do passeio e se repete as coisas tudo de novo. Carolina chega ajuda sua mãe limpar a casa toma banho vai almuça e vai descansar. E sempre as coisa se repitiam.
________vida de criança, vida de carolina, de um(a) aluno(a) da 4ª série

só na vida de carolina se repete as coisa tudo de novo ou o déjà vu

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Seção Trash

11/10/07
Véspera de feriado, já roteirizou seu finde? Com esse calor dramático e meu nariz mais seco que penico de mandruvá, a dica é sijogar onde tiver água. E é nessa direção em que os clãzinhos efervescentes se movem, antecipando o clássico overbooking na Enseada Azul e em Aparecida do Norte - onde acontece a romaria jet setter já anunciada em Beckstage. Antes, porém, a molecada calça novamente botas e chapéus e flamba o território agrodescolex da Expo 2007. E o Rancho do Tradicional - onde meu fotográfo modelón ficou quase uma hora na fila (isso a oposição vê!) - continua sendo o habitat natural dos baladeiros. Diferentemente do Rodeo Country Bulls, em que o povo sijogava nos camarotes e alcoolizava geral, né? E pára já de graça com essas comparações porque isso é evasão de privacidade sertaneja. E não se fala mais nisso, a não ser que hoje também rola Black & White, lá no Hotel Michelangelo. A gig é pilotada por Osmarzinho Ramos e o público, ainda bem, é dos mais tonificados. Pronto, agora você já tem três dicas em uma só nota. Diga que você quer mais.
_____ripa na chulipa, beck, no Jornal Bom Dia de SJRP
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sijoga, beck. da ponte. do camarote. eu não quero mais. ripa na chulipa daqui, já. é muita província, viu?, mais do que eu pensava []

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Das vantagens de ser confuso

olhar e ver tudo torto, errado das vantagens de ser incoerente demente, temente, tenente, patente das vantagens de ser repititititititivo das vantagens de ser livre, foda-se! das vantagens de se fingir de morto qual peixe na feira, olho aberto, parado das vantagens de ser totalmente louco, pirado, sem nenhum compromisso com nada, escravo da mente, sem consciência celular, sem celular, sem a porra da agenda, sem rima, sem nada, só a loucura insana a te emoldurar a alma loucura - esta bela armadura esta couraça intransponível este colete a prova de tudo este poema, impiedoso, a te perfurar o coração.
___________nicolas behr
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das vantagens de não se dizer o que se pensa e guardar energia

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

A VIA CRUCIS DO CORPO

Tinha oitenta e um anos de idade. Chamava-se dona Cândida Raposo. Essa senhora tinha a vertigem de viver. A vertigem se acentuava quando ia passar dias numa fazenda: a altitude, o verde das árvores, a chuva, tudo isso a piorava. Quando ouvia Liszt se arrepiava toda. Fora linda na juventude. E tinha vertigem quando cheirava profundamente uma rosa. Pois foi com dona Cândida Raposo que o desejo de prazer não passava. Teve enfim a grande coragem de ir a um ginecologista. E perguntou-lhe envergonhada, de cabeça baixa:
_ Quando é que passa?
_ Passa o quê, minha senhora?
_ A coisa.
_ Que coisa?
_ A coisa, repetiu. O desejo de prazer, disse enfim.
_ Minha senhora, lamento lhe dizer que não passa nunca.
Olhou-o espantada.
_ Mas eu tenho oitenta e um anos de idade!
_ Não importa, minha senhora. É até morrer.
_ Mas isso é o inferno!
_ É a vida, senhora Raposo.
A vida era isso, então? Essa falta de vergonha?
O médico olhou-a com piedade.
_ Não há remédio, minha senhora.
_ E se eu pagasse?
_ Não ia adiantar de nada. A senhora tem que se lembrar que tem oitenta e um anos de idade.
_ E... e se eu me arranjasse sozinha? O senhor entende o que eu quero dizer?
_ É, disse o médico. Pode ser um remédio.
Então saiu do consultório. A filha esperava-a embaixo, de carro. Um filho Cândida Raposo perdera na guerra, era uma pracinha. Tinha essa intolerável dor no coração: a de sobreviver a um ser adorado. Nessa mesma noite deu um jeito e solitária satisfez-se. Mudos fogos de artifícios. Depois chorou. Tinha vergonha. Daí em diante usaria o mesmo processo. Sempre triste. É a vida, senhora Raposo, é a vida. Até a bênção da morte. A morte. Pareceu-lhe ouvir ruído de passos. Os passos de seu marido Antenor Raposo.
________clarice lispector, conto: ruído de passos
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a via crucis do corpo é o livro da clarice que mais gosto desde quando ficar com tesão é ter vertigem de viver e outros eufemismos. por ser um livro de contos que ela escreveu muito rápido, alguns sob encomenda, tem textos divertidíssimos de tão toscos, com um certo humor que não se encontra fácil em outros livros dela. enjoy it.

sábado, 6 de outubro de 2007

Seção Trash

Sonhei que um piu-piu cor-de-rosa muito muito grande e com cara de jumento na ponta ficava balançando no ar e depois corria atrás de mim. Depois o piupiu grande passava na minha frente e eu tinha que montar nele, e a cara do piupiu que era de jumento virava para mim e passava o linguão dele mais quente que o do Juca na minha coninha. Eu gritei muito de medo do linguão, mas aí apareceu o He-Man e a princesa Léia, e o He-Man cortou com a espada só a cabeça do jumento mas o piupiu ficou inteiro do mesmo jeito, só que sem a cabeça grande do bicho, e entrou no meio das pernas da princesa Léia e ela gritava ui ui e parecia bem contente. O He-Man também estava com a espada atrás dela, da princesa, e eu estava segurando na trança da princesa Léia e a gente ia voando até o Corcovado. Esse pedaço [do sonho] foi bonito. (...)
____o caderno rosa de lori lamby, hilda hilst
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No caderno rosa de Lori Lamby, o pai de Lory, uma garota de 8 anos de idade, resolve escrever narrativas eróticas por já não acreditar que textos de qualidade são publicados e lidos. Com um papel escrito "BOSTA", ele separa em uma estante da biblioteca as revistas e as obras eróticas que ajudam na preparação do livro. Lori escuta as conversas do pai com o editor, pega as revistas e os livros e começa a escrever textos eróticos, desde cartas até estórias infantis. No caderno, Lori conta que transa, com o conhecimento dos pais, por dinheiro, com vários homens mais velhos. Por brincar com a pedofilia, o caderno é um escândalo desde a primeira página. Obsceno. Indigesto. Ofensivo. Incorreto. São alguns dos termos que os críticos usaram quando escreveram sobre esse livro da Hilda Hilst. A figura dessa seção é uma das ilustrações do Millôr Fernandes para o caderno. O texto é uma das cartas da Lori para o tio Abel. Por achar que o livro é simplesmente sem noção, eu transcrevo um trecho aqui. Eu não condeno o livro. Já aviso. {}

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

NO INÍCIO

no início vai sair sangue
muito sangue
no início vai doer
depois não vai doer mais não
no início você vai sofrer - aliás, você está aqui
pra que? –
no início você vai se desesperar
depois não vai se desesperar mais não
no início você vai querer morrer
depois não vai querer morrer mais não
__peregrino do estranho, nicolas behr

um poema para rir do tempo ou "vai passar"

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

SOBRETONS DE AZUL

Ver as coisas até o fundo...
E se as coisas não tiverem fundo?
Ah, que bela a superfície!
Talvez a superfície seja a essência
E o mais que a superfície seja o mais que tudo
E o mais que tudo não é nada.
Ó face do mundo, só tu, de todas as faces,
És a própria alma que reflectes.
____álvaro de campos

eu ganhei uma estrela de papel. eu gostava da estrela de papel. eu pintei a estrela de azul. eu fotografei a estrela de perto. a foto de hoje é uma estrela azul de papel. uma parte da estrela. uma estrela de perto, que já não é estrela, porque olhar a estrela de perto distorceu a estrela. a estrela só pode ser vista estrela de longe da estrela. {}

terça-feira, 2 de outubro de 2007

GALÁXIAS

queria dizer os poetas ou palavras ou estrelas ou estrêlulas
myriads of faint stars lampiros no empíreo galaxias kiklos de palavras
o texto entretecendo entretramando entrecorrendo pontos pespontos
dispontos texturas o estelário estepário de palavras costurando ávidas
suturando texturando urdilando ardilário vário laços de letras lábeis
tela téxtil telame aranhol aranzol de arames manhas de ramos ranhos
de aranhas letras sestras lépidas letreiros selva de símbolos também
selvaggia e aí estou aí fui aí sou eu outro eumesmo ninguénheu ou outro

_____galáxias, haroldo de campos

feitas de arame ou de anzol as palavras costuram texturam suturam urdilam textos entrelinhas interditos silêncios disparates galáxias de sentidos

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

ZEN

É a substância deste dia, um cachorro latindo, poucas pessoas na rua falando, árvores ao vento de algum sol. São os carros lá fora, aceleradores, e a cantora que ontem à noite no restaurante em frente. É a lisura do cerrado na seca e a terra vermelha e as plantas mirradas e retorcidas como se tivessem a minha mesma saudade. É a minha saudade, que pertence a hoje. É a minha palavra pequena e o meu pensamento pequeno que se faz ao se pensar e se esgarça como as nuvens na chapada. É a chapada que imaginei, antecipei e não vi. É o visto que não imaginei e não antecipei e correu periférico pela minha vida, entre um sinal de trânsito e outro. É a voz me pregando um susto ao telefone. É o acorde fluido que dura o tempo de uma inspiração (meu nascimento) e uma inspiração (minha morte). É não saber.
_______zen, adriana lisboa
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já é outubro e eu só quero não saber até venta de imprevistos ali fora {}