[do livro amor líquido]
Com a ação por impulso profundamente incutida na conduta cotidiana pelos poderes supremos do mercado de consumo, seguir um desejo é como caminhar constrangido, de modo desastrado e desconfortável, na direção do compromisso amoroso. Em sua versão ortodoxa, o desejo precisa ser cultivado e preparado, o que envolve cuidados demorados, a árdua barganha com consequências inevitáveis, algumas escolhas difíceis e concessões dolorosas. Mas, pior que tudo, impõe que se retarde a satisfação, sem dúvida o sacrifício mais detestado em nosso mundo de velocidade e aceleração. Em sua reencarnação radical, aguçada e sobretudo compacta como impulso, o desejo perdeu a maior parte de seus atributos protelatórios, enquanto focalizava mais de perto o seu alvo. Tal como nos comerciais que anunciavam o surgimento dos cartões de crédito, agora não precisamos mais esperar para satisfazer nossos desejos. [Bauman]
o desejo já não é passível de ser protelado, adiado. o desejo é antes compulsivo. ele exige a sua satisfação, o mais rápido possível. a satisfação, por sua vez, é instantânea, adiável. tudo junto. eu tenho um desejo. eu consigo o que quero. eu consegui mesmo? ou queria mais?...o que eu quero mesmo?. o que quero, ainda, é tranquilidade, antes até do amor. leio mais: compromisso não é "garantia de segurança", "solução de seus problemas", "é uma dor de cabeça, não um remédio". além disso, implica "uma incerteza permanente" e insegurança a respeito daquilo que se faz ou de "ter feito a coisa certa ou no momento preciso". tudo que, por enquanto, ainda me assusta. porque é tão fácil ir ali e acender um cigarro e tomar uma cerveja sozinha ou com um amigo sem insegurança e sem procura de sinais de interesse ou da falta de interesse de alguém por mim que amanhã eu vou ali acender um cigarro tomar uma cerveja e comemorar que a única certeza que tenho é a de que me interesso e a de que estou sempre aqui, independente do que eu faço e quando.